Para ti

Há cerca de 21 anos, tinha eu dezassete e ainda não tinha começado a namorar com aquele que viria a ser o meu companheiro de viagem e pai das minhas filhas, nasceste tu!! Grande, robusta, forte e liiiiiiiiinda!! Eu perguntei ao Rui (na altura já éramos loucamente apaixonados um pelo outro) se queria pegar em ti ao colo. A resposta dele foi imediata: -"Não, tenho medo de deixar cair, e ainda por cima não é nossa..." Aquele "ainda por cima não é nossa" foi uma crónica de um amor anunciado. Foi ter a certeza que ele iria ser o pai perfeito para os meus futuros filhos, mesmo com medo de pegar num bebé, com medo de o deixar cair... Mas isto tudo para te dizer que a resposta da tua mãe foi: - "Ó Rui, pega-lhe que ela não é de vidro..." mas ele mesmo assim não conseguiu, bloqueou e teve medo. Medo porque tu eras pequenina, medo porque podia deixar-te cair e medo porque "não eras nossa...". Enganou-se redondamente em todos os aspectos... Primeiro porque nunca foste (muito) pequenina, segundo porque mesmo quando caías, levantavas-te num ápice e terceiro porque és e serás sempre muito nossa... E eu tenho orgulho que sejas muito minha. Tenho orgulho daquilo em que te tornaste e do teu percurso até ao dias de hoje.
Dizes que não tens uma mãe, tens uma companheira de casa, mas eu lembro-me perfeitamente dela olhar embevecida para ti com a ternura e amor que só uma mãe pode ter. Lembro-me dela lutar por ti, e quando digo lutar, digo-o no verdadeiro sentido da palavra. Tu não te lembras, eras pequenina, mas ela lutou mesmo por ti... e isso valeram-lhe umas valentes nódoas negras!! Lembro-me da dor no seu rosto quando lhe era exigido mais e mais e ela se queixava que não tinha tempo para acompanhar o crescimento da filha para poder acompanhar o crescimento das filhas dos outros... mas era isso que vos punha a comida na mesa. Lembro-me do dia em que ela sentiu a dor de perder uma filha e por isso se agarrou a ti da melhor forma que pode e soube. Só que a vida é dura, a vida não nos dá tréguas e ela teve que lutar sozinha, não teve a vida facilitada. Viveu um grande amor proibido!! Sofreu a possessividade de um pai que não a deixou lutar por esse grande amor e a possessividade de um irmão que assumiu um papel de pai, neste caso, tirano...
Acho que as mães tudo fazem para que as filhas cresçam integras e independentes e tu foste obrigada a ser independente antes de tempo. Eu tinha orgulho de ti quando via o mapa de tarefas (feito por ti) na porta do teu quarto. Segunda feira: arrumar o quarto. Terça feira: fazer torradas para a avó. Quarta feira: limpar a casa de banho. Quinta feira: fazer torradas para a avó. Sexta feira: arrumar a sala. Sábado: fazer torradas para a avó. Domingo: brincar!!!!
Pequenina, tu cresceste depressa demais. Provavelmente tens razão quando dizes que querias uma mãe em vez de uma colega de casa, mas pensa que tu te tornaste naquilo que és com as referências (boas e más) que ela te deu. Ela nunca teve ninguém que a orientasse, por isso também andava perdida quando precisou de te orientar. Não a estou a desculpar, estou só a tentar dizer-te que a vida às vezes é muito madrasta e nós transformamo-nos em seres automáticos. Trabalhar, dormir, trabalhar, dormir. As mães querem tudo de bom para os filhos, e a tua quer tudo de bom para ti e acredita que para ela também não é fácil. Um dia tu vais entender, vais relativizar e achar que afinal ela até deu o seu melhor!! Um dia vais sentir a falta dela, e quando sentires essa falta, é porque afinal ela foi mais do que uma colega de casa. E um dia, quando fores mãe, vais também descobrir que os pais gostam muito mais dos filhos do que os filhos dos pais. E ela fá-lo da melhor maneira que aprendeu e sabe. E essas dores de crescimento que tu estás a sentir, acredita que ela está a sentir muito mais...
E por continuares a ser muito nossa, digo-te que essa tua tristeza deixa o meu coração pequenino, pequenino... e quando ele está assim por tua causa, ponho-me a imaginar essas covinhas nas tuas faces, que só aparecem quando tu esboças um lindo sorriso...
Amo-te do tamanho do mundo (se bem que do teu tamanho já era muito, bebé grande...)

Beijinhos doces

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